》Cúpula asiática lança sombras sobre a hegemonia dos EUA – Expresso Noticias
Vamos ao assunto:
Cúpula da OCS em Tianjin expõe tensões globais e fortalece críticas contra os EUA
A cidade de Tianjin, no norte da China, se prepara neste domingo e segunda-feira para receber uma das reuniões mais estratégicas do cenário internacional: a cúpula da Organização de Cooperação de Xangai (OCS). O encontro, que reúne mais de 20 chefes de Estado e de governo, incluindo o presidente da Rússia, Vladimir Putin, e o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, promete ser palco de fortes manifestações contra a influência norte-americana e de discussões sobre os rumos da geopolítica global.
Criado com o apoio de Pequim, o bloco é hoje o maior agrupamento regional em termos de população, reunindo países que somam não apenas bilhões de habitantes, mas também vastos territórios e riquezas naturais. A diversidade dos participantes impressiona: além das potências asiáticas, o fórum também atrai nações da Europa e do Oriente Médio, transformando-se em um ponto de convergência de interesses variados — e muitas vezes conflitantes.
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O encontro acontece em meio a um contexto de guerra comercial e crescentes atritos diplomáticos. Tanto a Índia quanto a China têm ampliado críticas a Washington, e a cúpula deve servir como espaço para que esses e outros países exponham queixas comuns contra as políticas dos Estados Unidos. A expectativa é que o evento funcione como um contraponto à hegemonia ocidental, especialmente em um momento em que o equilíbrio de forças globais está em disputa.
Apesar da aparente unidade, o bloco não está livre de contradições internas. Diversos membros carregam rivalidades históricas e disputas territoriais que dificultam consensos. A Índia, por exemplo, mantém tensões fronteiriças tanto com a China quanto com o Paquistão. Já no Oriente Médio, a rivalidade entre Arábia Saudita e Irã se estende para além de questões religiosas, afetando interesses geopolíticos e de energia. Até mesmo na Ásia Central, onde a influência de Moscou e Pequim é marcante, há resistências que afloram em momentos estratégicos.
Para especialistas, esse mosaico de alianças e desavenças torna a OCS um espaço diplomático singular. Como afirmou o analista Olander: “Há uma dinâmica complexa em jogo aqui”.
Mais do que um encontro protocolar, a reunião em Tianjin deve ser observada com atenção por governos de todo o mundo. O avanço da OCS, com sua capacidade de reunir atores tão distintos sob uma mesma mesa, reflete a busca por uma ordem internacional menos dependente do Ocidente. Nesse tabuleiro de poder, cada movimento é calculado — e as mensagens que emergirem da cúpula terão impacto direto nas próximas disputas comerciais, políticas e militares que moldam o século XXI.
Rivalidades, alianças frágeis e mensagens sutis: o que está em jogo na cúpula da OCS em Tianjin
![Ministros da Defesa de países como China, Índia, Irã, Cazaquistão, Quirguistão, Paquistão e Rússia aplaudem após uma foto de grupo, antes da Reunião de Ministros da Defesa da Organização de Cooperação de Xangai, em Qingdao, província de Shandong, China, em junho de 2025 [Florence Lo/Reuters]](https://expressonoticias.website/wp-content/uploads/2025/09/image-199.png)
“Por trás da foto de família feliz há muita observação”, disse ele.
A frase resume bem o espírito que domina a Organização de Cooperação de Xangai (OCS) neste fim de semana em Tianjin. Apesar da imagem pública de unidade, o encontro reúne países com interesses divergentes e disputas históricas, mas que compartilham uma pauta comum: contestar a influência dos Estados Unidos no cenário global.
Nos últimos anos, a OCS passou por uma expansão significativa, incorporando novos membros plenos como Índia, Paquistão, Irã e Bielorrússia. Outros países, como Afeganistão e Mongólia, acompanham como observadores, enquanto uma lista crescente de “parceiros de diálogo” já soma 14 nações, incluindo Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita, Turquia, Catar, Camboja, Mianmar e Sri Lanka. Esse crescimento reforça a projeção do bloco como uma alternativa cada vez mais relevante à ordem internacional dominada pelo Ocidente.
Um dos focos da cúpula será o Sudeste Asiático, região vista por analistas como o “grupo de estados indecisos” na disputa de influência entre Washington e Pequim. Estarão presentes cinco líderes da região, entre eles Anwar Ibrahim, da Malásia, e Prabowo Subianto, presidente eleito da Indonésia, além do secretário-geral da ASEAN, Kao Kim Hourn.
Mas o ponto mais aguardado do encontro é a interação entre o presidente chinês Xi Jinping e o primeiro-ministro indiano Narendra Modi. Os dois não se reúnem há sete anos, período marcado por fortes tensões. Embora Nova Déli seja tradicionalmente próxima de Washington, a Índia se viu alvo nesta semana de tarifas de 50% impostas pelo ex-presidente Donald Trump, em resposta à manutenção das compras de petróleo russo. A medida aumentou o desconforto com os EUA e, paradoxalmente, aproximou Índia e China, que tentam superar as feridas abertas pela violenta escaramuça de fronteira no Himalaia em 2020.
Embora tenham firmado um acordo em 2024 sobre a linha de fronteira, o clima entre os dois gigantes asiáticos continua frio. Analistas apontam que Pequim vê na atual guerra comercial uma oportunidade de atrair a Índia para longe de iniciativas militares e políticas apoiadas por Washington, como o QUAD — que reúne EUA, Japão, Austrália e Índia em um fórum de segurança estratégica. “A chave é observar como a China [caracteriza] seu relacionamento com a Índia após a visita e como o relacionamento entre China e Índia melhora”, afirmou o pesquisador Claus Soong, do Instituto Mercator de Estudos da China, em entrevista à Al Jazeera.
Além disso, a cúpula também será palco de uma aguardada reunião entre Xi Jinping e Vladimir Putin, a primeira desde que o líder russo se encontrou com Trump no Alasca, no início do mês, para discutir a guerra na Ucrânia. Especialistas estarão atentos ao tom utilizado pelos dois presidentes para descrever a parceria bilateral. Em 2022, semanas antes da invasão da Ucrânia, Moscou e Pequim assinaram um pacto de “parceria sem limites”, que vem garantindo suporte econômico fundamental à Rússia, em grande parte viabilizado pelo comércio chinês.
Esse alinhamento, no entanto, gera desconforto em Nova Déli, que observa a China desempenhar um papel muito mais ativo em sustentar a economia russa, sem sofrer as mesmas penalidades que a Índia enfrenta por parte de Washington.
Com tantas tensões latentes, analistas acreditam que o desfecho mais provável do encontro será uma declaração conjunta cuidadosamente calibrada. Para Daniel Balazs, pesquisador da Escola de Estudos Internacionais S. Rajaratnam, em Cingapura, o documento final deve reafirmar posições tradicionais de China e Rússia, como a oposição ao “unilateralismo” — termo usado como crítica velada aos EUA —, mas em uma linguagem suficientemente neutra para obter o consenso dos membros.
“O simbolismo de realmente alcançar uma declaração conjunta é mais importante do que o conteúdo da declaração em si”, afirmou Balazs. Segundo ele, o texto deve ser amplo e pouco polêmico, trazendo menções a “segurança e estabilidade, melhoria da cooperação econômica e a importância do multilateralismo”.
Assim, a cúpula da OCS em Tianjin não deve trazer soluções concretas para as disputas entre seus integrantes, mas servirá como um termômetro de como o equilíbrio de poder está mudando em direção a uma ordem internacional cada vez mais multipolar.
Tianjin abre caminho para Pequim: China aposta em simbolismo militar e diplomático para projetar liderança global
Policiais montam guarda em frente ao Portão da Paz Celestial, em uma área temporariamente fechada para visitantes devido a obras, antes de um desfile militar que marca o 80º aniversário do fim da Segunda Guerra Mundial, em Pequim, China, em 20 de agosto de 2025 [Florence Lo/Reuters].
Após o encerramento da cúpula da Organização de Cooperação de Xangai (OCS), os líderes convidados permanecerão na China por mais um dia, em 2 de setembro, antes de seguirem para Pequim, onde será realizado, no dia 3, um grande desfile militar em homenagem aos 80 anos do fim da Segunda Guerra Mundial na Ásia.
Segundo Olander, do Projeto China-Sul Global, esse dia adicional se tornará um momento estratégico para encontros bilaterais de alto nível. “Quem vai enfrentar quem no dia 2 de setembro é algo em que devemos prestar atenção”, disse ele, destacando que os bastidores dessas reuniões podem revelar mais do que o desfile em si.
O evento do dia seguinte deve reunir ainda mais chefes de Estado e de governo, entre eles o líder norte-coreano Kim Jong Un, o presidente da Sérvia Aleksandar Vucic e o primeiro-ministro da Eslováquia Robert Fico. A expectativa, no entanto, é que o premiê indiano Narendra Modi não participe do desfile. Analistas acreditam que ele pode optar por enviar um representante, como seu chanceler, para evitar tensões diplomáticas sem perder espaço no cenário internacional.
Para Claus Soong, especialista do Instituto Mercator de Estudos da China, a ampla lista de convidados tanto para a cúpula quanto para o desfile militar reforça a estratégia de Pequim de exibir sua rede de aliados e simpatizantes. “É assim que a China demonstra seu círculo de amigos – quem pode ser amigo da China e quem está disposto a endossar a narrativa da China”, afirmou.
No plano simbólico, o desfile militar não será apenas uma celebração histórica. Ele representará também uma vitrine de poder, um recado ao Ocidente e, sobretudo, aos países do Sul Global, onde Pequim busca consolidar apoio em sua disputa de influência com os Estados Unidos.
Com isso, a sequência de eventos em Tianjin e Pequim funciona como duas faces de uma mesma estratégia: de um lado, a diplomacia multilateral da OCS, que expõe a fragmentação e os interesses divergentes dentro do bloco; de outro, a grandiosidade militar e a narrativa histórica da China, projetando a imagem de uma potência capaz de liderar um mundo multipolar.
O verdadeiro impacto, no entanto, dependerá menos das paradas e comunicados oficiais e mais das conversas discretas e alianças sutis firmadas nos bastidores — encontros que podem redefinir o equilíbrio de poder global nos próximos anos.
Com informações de Agências de Notícias*
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