》Relatora da ONU é perseguida pelos EUA por expor o horror em Gaza – Expresso Noticias

Vamos ao assunto:

A responsável da ONU sobre os direitos humanos, Francesca Albanese, é alvo de sanções americanas após denunciar Gaza como vítima de um genocídio silencioso, onde fome e tiros se confundem


Em meio a uma crise humanitária sem precedentes na Faixa de Gaza, a relatora especial da ONU sobre os direitos humanos nos territórios palestinos ocupados, Francesca Albanese, enfrenta agora uma nova barreira em sua missão: sanções impostas pelos Estados Unidos que, segundo ela, ameaçam limitar sua liberdade de movimento e de ação.

Em entrevista à Reuters por videoconferência, enquanto participava de eventos em Sarajevo em memória do genocídio de Srebrenica, Albanese afirmou que as sanções dos EUA terão um “efeito gélido” sobre sua capacidade de trabalhar e interagir com cidadãos norte-americanos. “Isso vai me impedir de me locomover e vai dificultar que pessoas que colaboram comigo continuem a fazê-lo, por medo de represálias”, disse.

As sanções, anunciadas na quarta-feira pelo secretário de Estado norte-americano Marco Rubio, incluem o congelamento de ativos e possíveis restrições de viagem. A justificativa do governo dos EUA é que Albanese teria incentivado “prosecuções ilegítimas” contra cidadãos israelenses no Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia.

Albanese, italiana, advogada e acadêmica, é uma das vozes mais incisivas na defesa dos direitos dos palestinos. Recentemente, publicou um relatório exigindo que o Conselho de Direitos Humanos da ONU impusesse um embargo de armas e interrompesse relações comerciais e financeiras com Israel, acusando o país de conduzir uma “campanha genocida” em Gaza.

“Não há mais linhas vermelhas. É assustador”, afirmou Albanese, que é a primeira relatora especial da ONU a ser alvo de sanções dos Estados Unidos. A própria ONU manifestou preocupação com a medida, pedindo que seja revertida. A União Europeia também se posicionou contrária, dizendo “profundamente lamentar” a decisão.

Já Israel chamou o relatório de “ilegal, difamatório e um abuso de cargo”. O país reafirma que suas ações em Gaza são de autodefesa, após o ataque do Hamas em 7 de outubro de 2023 que resultou na morte de mais de 1.200 pessoas em solo israelense.

Fome e morte: a realidade brutal em Gaza

Enquanto debates sobre sanções e liberdade de expressão tomam o centro do palco diplomático, na Faixa de Gaza, a realidade é de fome generalizada e morte em escala massiva. Entre 27 de maio e 7 de julho, 798 palestinos perderam a vida ao tentar acessar centros de distribuição de alimentos — a maioria deles, 615 pessoas, perto das instalações da Fundação Humanitária de Gaza (GHF).

“Estamos diante de uma escolha cruel: morrer de fome ou arriscar a vida buscando comida”, relata Ibrahim Abu Ghazaleh, fotógrafo palestino de 27 anos. “A ajuda humanitária está matando cidadãos, e a fome está corroendo nossos corpos. Eles estão nos matando deliberadamente nos centros de distribuição. A fome virou uma arma.”

Mahmoud Basal, porta-voz da Defesa Civil de Gaza, responsabilizou as “forças de ocupação israelenses” por deliberadamente alvejarem civis famintos. “Essas mortes não são acidentais. É uma política sistemática de matar civis sob o pretexto de segurança. Eles só querem aumentar o número de vítimas.”

A Fundação Humanitária de Gaza é uma das poucas entidades locais que ainda consegue distribuir algum tipo de assistência. No entanto, os comboios humanitários enfrentam constantes ataques. As mortes ocorrem principalmente por disparos de tanques e drones israelenses, que, segundo testemunhas e relatos de sobreviventes, atiram indiscriminadamente em multidões desesperadas por um pão ou um litro de água.

Anjit Sunghay, chefe do Escritório de Direitos Humanos da ONU nos Territórios Ocupados, disse à reportagem que é “muito difícil” descrever a situação em Gaza. “As mortes continuam diariamente, seja por ataques aéreos, disparos de tanques ou por tiros contra civis que buscam comida. Não há como justificar que pessoas famintas e desesperadas representem uma ameaça à vida de soldados israelenses. A pergunta que precisamos fazer é: por que atirar nelas?”

Sunghay lembrou que, segundo o direito internacional humanitário, o uso de força letal contra civis só é admissível em situações extremas, como defesa própria imediata. “O que estamos vendo é o uso sistemático da violência contra pessoas vulneráveis. É uma violação clara do direito internacional.”

A fome como política de guerra?

A ONU alerta há meses que a população de Gaza enfrenta riscos de fome em escala catastrófica. Desde o início da guerra, em outubro de 2023, mais de 57 mil palestinos perderam a vida, segundo dados locais. O acesso à comida, água e medicamentos é extremamente limitado. Hospitais funcionam sem energia e com equipamentos obsoletos. Crianças são encontradas em estado de desnutrição severa, muitas sem forças para chorar.

“Toda a ajuda humanitária possível é necessária. Comida, água, abrigo, saúde, saneamento — tudo é urgente”, reforçou Sunghay. “A fome não é apenas um efeito colateral da guerra. É uma consequência direta de políticas que limitam o acesso à ajuda. E quando a única forma de conseguir comida é enfrentando balas, estamos diante de um crime de guerra.”

Versão israelense: “minimizar fricções”

Diante das denúncias de ataques sistemáticos a civis, o Exército israelense afirmou à AFP que trabalha para “minimizar fricções” entre soldados e palestinos, e que realiza “análises exaustivas” de cada incidente. “Foram dadas instruções às forças no terreno com base nas lições aprendidas”, disse o porta-voz do Exército de Defesa de Israel (IDF), em nota oficial.

No entanto, reportagens independentes e depoimentos de soldados israelenses contradizem essa narrativa. Em 27 de junho, o jornal Haaretz publicou um relato anônimo de soldados que afirmaram ter recebido ordens explícitas para atirar em civis desarmados em filas de ajuda humanitária. O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu e o ministro da Defesa, Israel Katz, negaram categoricamente a reportagem, chamando-a de “mentiras maliciosas” e acusando o veículo de tentar “difamar as IDF, o Exército mais moral do mundo”.

António Guterres, secretário-geral da ONU, alertou recentemente que “qualquer operação que force civis desesperados a se locomoverem para zonas militarizadas é inerentemente insegura e está matando pessoas”. Sua declaração ecoa o clamor de organizações humanitárias e grupos de direitos humanos que apontam para uma estratégia deliberada de uso da fome como arma de guerra.

Com informações de Reuters*

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